FILOSOFIA E LINGUAGEM
* Mário José dos Santos
Está no DNA da Filosofia
o procedimento crítico. O juízo crítico supõe discernimento (arte de
julgar de forma clara) e adota um critério. Critério é um termo de
origem grega que significa “medida” ou lei que nos permite, até certo
ponto, distinguir falsidade e verdade,
bem e mal. Exercer o juízo crítico implica “julgar” e só pode julgar
quem possui critério, isto é, a “medida justa”, supostamente,
verdadeira. E esta pode no-la dar, dentro de certos limites, a filosofia. Logo,
julgar com base numa medida criada pela imaginação ou pela fantasia é,
simplesmente, um ato desvairado. Quem vive distraído olvida que, além das
funções vitais (comer, beber e lazer), há uma essencial, imprescindível:
pensar. A televisão tem duas filhas “nobres”: a diversão e a “preguiça
mental”. Lamentavelmente, o caminho de saída da inércia existencial – o bom
livro – está desprestigiado. Dizem que “os olhos são janelas da alma”. Esse
fragmento popular parece coincidir bastante com a verdade. Àquela face humana
cabisbaixa, semidestruída (feita de olhar sem brilho e sem determinação),
segue-se um discurso (uma fala) anunciador de uma interioridade polida pelo
medo e/ou pelo ódio. Trata-se de um ser agoniado, batido pelo sofrimento,
morrendo de dentro para fora. Quem se dedica à filosofia sente-se, quase
sempre, incomodado por este tipo de comportamento, sobretudo, quando aceito
pacífica e tacitamente, porque nele constata a falta de amadurecimento do senso
crítico. E, essa maturidade, só advém através dos caminhos abertos pela “reflexão”,
característicos daquela sabedoria que predispõe o ser humano para decisões
corajosas e atitudes eficientes reclamadas pelo cuidado e pela consideração de
si mesmo. A linguagem, que manifesta o pensamento, é espelho dos sentimentos,
reveladora, portanto, da interioridade. Quem está, por exemplo, amargurado
dificilmente conseguirá produzir uma fala livre deste sentimento, que inspire
coragem e força de superação. A linguagem e o pensamento estão inseparavelmente
ligados e interinfluenciam-se. Seria muito útil lembrar aqui que “sabedoria
e “sabor” têm uma única e mesma origem etimológica. Derivam do vocábulo latino “sapere”. Significa
que, quando se procura a “verdade”, ela só se encontra naquilo que tem
sabor (gosto) de realização, de conquista, de caminho trilhado com satisfação, alegria
e eficiência. Infelizmente, há aqueles que lutam contra-si-mesmos (fenômeno da
autorrejeição), quando deveriam lutar em prol de si mesmos (ainda que por
instinto de sobrevivência), evitando a autoflagelação e o “vitimismo”
decorrentes da obtusidade “pré-filosófica”. Entenda que a filosofia não
é privilégio dos eruditos, de pesquisadores e dos catedráticos, mas que está ao
alcance de qualquer ser humano (por natureza, racional) desde que aceite
e adote a sábia decisão de fazer sempre uma coisa simples: pensar. E
aquele que pensa é quem põe, com firmeza, os alicerces e adquire os
pressupostos de uma conduta aberta, sólida, tranqüila e veraz. Isso é mais belo
que o extasiar-se, num fim de tarde, contemplando uma maravilhosa panapaná.